Palavras chave: Pequenos estados insulares, Mudanças climáticas, Financiamento climático e Sustentabilidade.
As praias ingénuas de areia branca, o mar turquesa e a brisa acolhedora do povo cabo-verdiano tornam Cabo Verde um destino turístico belo e único, situado no coração do Atlântico. É um país insular e enfrenta desafios significativos relacionados com as mudanças climáticas, exigindo intervenções estruturais, especialmente no que diz respeito ao financiamento climático. Um olhar mais afinado aos países com esta especificidade pode fazer com que Cabo Verde acompanhe a evolução mundial, promova o crescimento económico, amplie as oportunidades e, principalmente, enfrente os efeitos visíveis que as mudanças climáticas têm causado enquanto Pequeno Estado Insular em Desenvolvimento (PEID).
Trabalhar em metas alcançáveis e definir estratégias para aumentar o financiamento, a fim de atender às demandas, é uma das transformações mais significativas que Cabo Verde deve alcançar. Tal facto permitirá abordar de forma eficaz esta temática e mobilizar recursos para financiar as consequências das mudanças climáticas. Outrossim, torna-se urgente enfrentar os desafios impostos pelas mudanças climáticas com a implementação de estratégias robustas de captação de financiamento climático, com foco na proteção de seu ambiente natural e de suas comunidades.
Para alcançar este objetivo Cabo Verde deve pensar grande, ser cada vez mais ambicioso. É preciso um conjunto de esforços a todos os níveis, desde colaboração público-privado, parceiros estratégicos, apostar na promoção de tecnologias sustentáveis e a conscientização da população, sendo que este último que considero como ser um dos mais desafiadores. Sonhar grande! Com todo este engajamento Cabo Verde pode se posicionar como um exemplo resiliente de adaptação e mitigação, preservando sua beleza singular e garantindo um futuro seguro para as próximas gerações.
Indo um pouco para o âmbito mais teórico, o conceito de financiamento climático, conforme estabelecido pela Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês), tem vindo a sofrer evoluções, e considero ser um dos maiores progressos verificados a nível mundial. Isto porque, à medida que as negociações climáticas avançam e as necessidades dos países em desenvolvimento se tornam mais evidentes. Este conceito é definido como a estrutura de fundos e mecanismos de financiamento, criados ou regulamentados internacionalmente, para apoiar esses países na transição climática e na mitigação dos efeitos das mudanças climáticas. Havemos de concordar que está claro que não há uma definição única, pois se trata de um tema complexo que pode ser analisado sob diferentes perspetivas. Além disso, no que diz respeito às negociações, estamos diante de um processo contínuo, que tende a evoluir conforme surgem novas necessidades e desafios.
Ainda nesta abordagem um pouco mais teórica, o financiamento climático se configura como pilar fundamental na luta contra os efeitos das mudanças climáticas e representa os recursos financeiros destinados a mitigar as causas e os impactos das mudanças climáticas. Realço que se deve mencionar esta relação, porque os recursos financeiros são de extrema importância para conter a mitigação, auxiliar na adaptação e a reduzir os efeitos das perdas e danos, promovendo desta feita uma transição justa e a dignificação daqueles de têm parcos recursos, questão ainda mais agravante quando se trata de economia pequena de um estado insular.
Cabo Verde é um LMIC (low-income countries) e, apesar dos progressos na área política climática, ainda enfrenta diversos desafios. Entre eles, destacam-se o combate aos efeitos das mudanças climáticas, a implementação eficaz de mecanismos de mitigação e a mobilização de recursos para operacionalizar o Plano Nacional de Adaptação. Além disso, a crise económica e financeira a nível mundial representa também um obstáculo significativo na busca incessante de recursos para fazer face aos efeitos imediatos das mudanças climáticas, como a pluviosidade diminuída e as secas prolongada, com um olhar fixo na transição justa.
Aliás a busca por uma transição justa, aliada à necessidade de incorporar novas tecnologias no contexto climático, impõe cada vez mais novos desafios aos países de rendimento médio baixo, que já lidam com a escassez de recursos financeiros e humanos, além de uma demanda crescente de financiamento. O que se conclui é que devemos apostar fortemente em desenvolver capacidades locais e fortalecer parcerias internacionais e fazer valer a nossa vez e voz nas discussões a nível mundial.
Continuo a advogar que dentro do contexto de insularidade em prol dos Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento, os fundos climáticos como Fundo Verde para o Clima (GCF), Fundo Especial para as Mudanças Climáticas (FEMC), Banco Mundial, Banco Interamericano de Desenvolvimento, devem criar mecanismos que permitem o acesso com menos burocracias destes estados ao financiamento, uma vez que estas economias ainda emergentes são as que estão a sofrer com maior intensidade os efeitos das mudanças climáticas. Que tal a criação de um fundo chamado “Fundo de Resiliência dos SIDS”? Apostar na melhoria da capacidade institucional, diminuir a complexidade dos processos, melhorar as condições de acesso, promover acesso às informações de forma clara e transparente, pode facilitar o acesso daqueles que mais precisam. Um olhar diferente aos pequenos estados insulares. Os desafios dos SIDS no financiamento, giram em torno da falta de recursos e a necessidade de maior coordenação entre os diferentes stakeolders.
Fazendo um parêntesis, convido-vos a percorrer a Baía de Achada Leite, a Ribeira de Charco, o lado norte do Rincão, a Ribeira de Sedeguma e a Ribeira de Saquinho, bem como algumas das zonas mais recônditas do município de Santa Catarina de Santiago. Em tempos de chuvas abundantes e esperança radiante, esses lugares eram verdadeiros oásis de alegria e vitalidade. Hoje, no entanto, a crescente emigração e o êxodo rural, essas paisagens, que outrora vibravam com a vida, agora enfrentam um silêncio triste. Apesar de uma população reduzida, a dor da pouca pluviosidade ressoa profundamente, deixando cicatrizes visíveis no solo e nas almas de quem ali permanece. É um lamento coletivo que ecoa nas ribeiras, um apelo à memória das chuvas que um dia trouxeram prosperidade e cor. Que possamos registrar e lutar por um futuro em que a esperança volte a brotar, trazendo de volta a alegria e neste momento urge brotar mais e novos investimentos para mitigar os efeitos das mudanças climáticas nesses locais e não só. Um olhar diferente à nossa morabeza que sempre foi tão resiliente. Digo isto por uma razão muito simples, as minhas raízes e identidade originaram nestas localidades.
Quero que com a mobilização de recursos cada vez mais, Cabo Verde se torne um caso de sucesso com muitos outros estados insulares. Os casos de sucessos de financiamento climático em pequenos estados insulares e em desenvolvimento que me cativaram e que considero que podem ser replicados em Cabo Verde são: a implementação de um sistema de alerta precoce para tsunamis e outros eventos extremos nas Ilhas Marshall1, o desenvolvimento de um plano de adaptação que inclui medidas para proteger os ecossistemas costeiros e fortalecer a resiliência das comunidades de Seicheles2, investimento em projetos de energias renováveis com instalação de sistemas solares em comunidades rurais, reduzindo assim a dependência de combustíveis fósseis e consequentemente a emissão dos gases de efeito de estufa em Samoa3, bem como outros exemplos de sucessos. É nítido que investir cada vez mais em projetos desta natureza nos SIDS irá fortalecer as pequenas economias, a limitada capacidade institucional e a alta dívida pública.
Devemos ser um pequeno grande país. Para que isto possa acontecer é necessário aumentar o financiamento para a mitigação e adaptação nos PEID, destacando as lacunas entre as necessidades e os recursos disponíveis. Devemos buscar soluções inovadoras, como instrumentos financeiros criativos, mobilização de recursos privados e a cooperação entre os diferentes atores. Além disso, é fundamental apostar fortemente em políticas públicas e de governança, com uma atenção especial às autarquias e enfoque na nossa diáspora. São 22 municípios com características e particularidades únicas e uma diáspora que abraça a sua terra natal desde sempre.
A morabeza crioula, minha identidade, a resiliência do povo cabo-verdiano presente na corrente sanguínea, num contexto tão delicado, merecem uma atenção especial. É urgente realçar a importância de apoiar essas qualidades, que são fundamentais para a identidade e a força de Cabo Verde. Agora é o momento de agir. Vamos financiar o verde, promovendo um futuro sustentável.
Autoria
Jandira de Carvalho,
Técnica de Planeamento, DNP